O que você faria se tivesse muito dinheiro e muito tempo
livre?
É extraordinário encontrar livros que te envolvem em uma trama tão bem amarrada em tão pouco espaço e tempo, como O Colecionador, 1963 - John Fowles com tradução do Antônio Tibau, 2018 (DARKSIDE, pag 343) faz. Então um amigo me falou do Filme, dirigido por William Wyler dois anos depois em 1965, estrelado por Terence e Samantha.
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Foto do meu livro pelo app da Darkside |
“Sei o que algumas pessoas achariam, elas achariam meu jeito
peculiar” - Frederick Clegg - Vulgo Ferdinand - Vulgo Caliban - Vuldo O
Colecionador (essa é a abertura da introdução exclusiva (meu corretor trocou
duas vezes por explosiva então devo deixar que seja) feita pelo King.
Em 1963 John Fowles lançava o que seria seu livro de maior sucesso - O Colecionador - Uma historia claustrofóbica que se passa nos arredores de Londres. Depois de ganhar na loteria Frederick Clegg um homem pacato com problemas no trato com pessoas se vê com muito tempo e dinheiro para planejar um sequestro. Acontece que Clegg é também um homem apaixonado e devido sua dificuldade em lidar com os seus próprios sentimentos e em como se sentia sobre as pessoas ao seu redor, mesmo depois de ficar rico Clegg nunca teve coragem de falar com sua amada Miranda.
Miranda por sua vez era uma bela jovem de 20 anos que morava de frente ao anexo da prefeitura onde Clegg trabalhou antes do dinheiro da loteria, era de lá que ele a via chegar e sair e nutriu por ela durante muito tempo uma adoração, Miranda era a mulher mais perfeita e apenas as pessoas ao seu redor eram capazes de fazê-la ordinária com atitudes que a obrigavam a ser comum.
As vezes o destino te dá uma oportunidade e você tem que
aproveitar e quando Miranda recebeu uma bolsa para estudar numa escola de Artes
em Londres as tardes em que Clegg esperava por sua volta do colégio interno acabariam
de vez, com ela morando tão longe seria impossível vê-la, e o seu mundo não
seria mais o mesmo. Mas o destino deu a Clegg 73 mil libras, o que era um
absurdo de dinheiro pra quem vivia bem com tão pouco. Clegg perdeu o pai ainda
criança, foi abandonado pela mãe e criado por seus tios junto a uma prima. Tio
Dick ensinou o Clegg a pescar e a colecionar borboletas, Clegg se formou em matemática
e biologia, tinha o titulo de Entomologista e uma coleção de borboletas que ele
gostava de assegurar ser "melhor do que a que eles tem no museu no
historia natural". Depois da morte de seu tio Clegg cresceu sem uma figura
paterna, talvez isso tenha dificultado alguma coisa, ser criado por uma tia viúva
cujo a filha sofria uma deficiência também não ajudava, mas Clegg virou um
adulto educado e trabalhador, isso era de se comemorar.
Depois de ganhar na Loteria não mudou muito, embora a família
de Clegg não quisesse gastar seu dinheiro, aceitaram se mudar com ele para
Londres, e viver uma vida com mais regalias, ate decidirem deixá-lo. Clegg
então sozinho não tinha muito o que fazer, ele comprou uma casa afastada (mais
de uma hora do centro comercial) essa que tinha um porão dentro de um porão,
com entrada e saída pelo lado de fora, era o lugar perfeito para receber uma
hospede, perfeita para receber Miranda. Enquanto fazia planos Clegg se
convencia que planejar era um passa tempo de quem tem tempo e dinheiro e não
precisa levar a vida como meros camponeses, mas, não é de verdade é apenas pra
saber se seria possível. E se fosse possível? Com algumas semanas Clegg já
sabia dos horários de Miranda, de seus amigos e até alguns de seus gostos, isso
facilitou a montagem de um quarto relativamente aconchegante em seu porão, com
trancas nas portas e sem janelas é claro, no andar de cima, uma cozinha para
facilitar alimentá-la, no mais toda sujeira, incluindo as roupas que Miranda
viria a usar seria incineradas para não chamar a atenção. Era tudo
perfeitamente plausível, se Miranda o conhecesse bem. se ela passasse um tempo
com ele, ela aprenderia a amá-lo e a respeitá-lo, Miranda entenderia o que o
que ele fez foi necessário para que eles se conhecessem melhor sem a interferência
de seus amigos "afetados", ela entenderia, porque ela estaria apaixonada. Então numa
noite de chuva Clegg leva Miranda para sua nova casa.
Em 1965 William Wyler dirige a adpação do livro para o
cinema, essa que lhe rendeu uma indicação ao Oscar de melhor diretor em 1966
aos seus 64 anos e uma puta histórico (dirigiu O Morro dos Ventos Uivantes, Ben-Hur
, A Princesa e o Plebeu e outros grandes sucessos e para dar inicio a direção
de O colecionador Wyler deixou a produção do Musical A noviça rebelde). O filme
trouxe Terence Stamp e Samantha Eggar nos papeis principais o que é basicamente
como no livro praticamente os que importam. Durante as filmagens Samantha
sofria diversos tipos de abusos psicológicos que segundo o diretor trouxe a
melhor das interpretações e lhe rendeu uma indicação ao Oscar de melhor Atriz e
o premio Globo de Ouro em 1966 por melhor atriz dramática.
No livro, nós encontramos duas versões igualmente claustrofóbicas
para esse pesadelo vivido por Miranda. Primeiro
a Clegg, (Frederick, Ferdinand, Caliban, seqüestrador), uma versão romântica do
seu ato, como seu amor por Miranda pudesse dar sentido as tais atrocidades, e
do que ela poderia reclamar? para um sequestro ela estava sendo muito bem
tratada, ali ela era uma hospede, só não podia ir embora quando quisesse. Em
dados momentos chegamos a sentir pena do pobre Clegg, tão desajustado
socialmente, tão afetado psicologicamente pela criação e pelo abandono, tão solitário
e começamos a imaginar que tipos de abuso Clegg sofreu e como foi difícil a sua
vida antes do dinheiro. Antes de Miranda.
Ainda no livro (que não vemos no filme) leremos o diário de
Miranda, com a visão não romântica de seu sequestro, e até ai nos entendemos
por que sentimos pena de Clegg, Miranda também sente. Em dados momentos, ela
parece acreditar quando ele diz pra ela que ela ficará apenas um mês. Isso me
ajudou a ver no filme o lado psicopata de Clegg, em todo os momentos ele
aparece muito confuso, mas cirurgicamente assertivo, ele é um homem
inteligente, nada diz o contrario, e apesar de Miranda achar que ele não tem
"cultura" tanto o livro como o filme só mostram um tipo de visão
distorcida do que é arte, literatura, musica e até sexo ou contato físico.
Ambos (livro e filme) tratam os abusos que Miranda sofre de maneiras muito
abertas, mas no filme ela é uma personagem muito menos complexa do que no livro
que nós dá mais informações sobre ela, e de certa forma nos mostra os motivos
da paixão de Clegg por Miranda ser doente. As descrições de que ele faz de Miranda são
realmente muito puras:
Seus cabelos, cor, tamanho, o jeito como ela os prende
ou como fica linda quando os deixa soltos. Seus olhos, a cor da sua pele, a
maneira que as roupas lhe caem bem e como ela se move. (não veremos isso no
filme) Umas das coisas que Clegg ama em Miranda é a maneira que ela se mantém
inocente apesar das companhias "afetadas". Mas, então percebemos o
quanto é frágil a motivação de Clegg, tudo que ele sabia sobre Miranda era pura
construção da sua mente, inclusive seu nome, que ele só soube depois de ver uma
foto no jornal anunciando sua bolsa de estudos. Miranda não era diferente das
borboletas de sua coleção, e vemos isso tão claramente quando percebemos que
Clegg admira muito mais a moça quando ela está desacordada, sob o efeito de clorofórmio.
Quando ele relata sobre suas fotos, (No livro ele pede para fotografar Miranda
e ela permite por varias vezes, mas, ele deixa claro que as fotos que ele mais
gosta são as que tirou quando ela estava desacordada).
Passadas as semanas que
Miranda contou ansiosamente, Clegg bolou um plano para se desfazer da sua
promessa, dar-lhes presentes para que ela se sinta grata e então pedi-la em
casamento. Miranda que ja planejava uma festa ganha um vestido, uma colar de
brilhantes e Clegg guarda um anel de noivado. Mas, tudo sai de controle quando
ela percebe o plano para que continue prisioneira e se desespera, obrigando seu
anfitrião a dopá-la com clorofórmio e levá-la de volta ao seu quarto. Dias
depois e tentativas absurdas e frustradas de fugir de dali e depois de uma
chuva forte Miranda fica doente, apesar de parecer grave Clegg continua dizendo
que vai trazer o medico ate ser tarde demais. Com finais idênticos tanto no
filme quanto no livro vemos Clegg ir e voltar do consultório em meio ao
desespero de perder a mulher que ama e ser pego por não poder explicar a
situação. "As pessoas não entenderiam.".
No
filme como no livro vemos Clegg seguir a sua próxima vitima, uma mulher
parecida fisicamente com Miranda (Depois de saber o quão falsa ela era lendo o diário
que achou no quarto depois de sua morte) Clegg não queria outra Miranda para
lhe dar ordens, dessa vez ele queria uma mulher que não fosse tão esperta,
sagaz e inteligente como Miranda era, e dessa vez ele sabia que tinha de deixar
claro quem manda.
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